Após muitas e muitas decisões conflitantes o Tribunal de Justiça do Estado/RS, mesmo que tardiamente (pois há mais de um o Supremo Tribunal Federal já tinha decido esta matéria em favor dos servidores) está firmando posição em favor da correção judicial dos valores do Vale-refeição. Então, aos nossos clientes,uma luz no fim do túnel.
Este assunto de decisões “conflitantes” não é tão novo assim e para quem milita no Direito há quase duas décadas tem algumas histórias para narrar.
Desde o tempo do Vencimento Básico dos Servidores Militares Estaduais – SME, inferior ao Salário Mínimo Nacional.
Quando imaginávamos que o Supremo Tribunal Federal – STF tinha formado posição em favor do pleito dos servidores, o Ministro Nelson Jobim suscitou ao Pleno daquela Corte a inconstitucionalidade da Constituição Estadual/RS (frente a Constituição Federal) que estendia este direito aos militares. Como sempre advoguei para os Servidores, fomos derrotados por maioria e a decisão proferida pelo STF (Pleno) fez com que os Tribunais e Juízes devessem segui-la.
Logo demos início as ações dos 19% (lei Brito) em 1998. Mais uma vez, em decorrência de decisões judiciais “conflitantes” vivemos um grande dilema. Ao invés de nos apegarmos no direito, tínhamos que nos apegar com a sorte.
Quando o cliente nos contratava e perguntava se iríamos ganhar a acusa, dizíamos, depende. Mas depende do que nos dizia o cliente? Então lhe dizíamos que dependia do sorteio. Quando o cliente já estava deixando de nos contratar por desconfiar de nossas habilidades, lhe explicávamos que o “sorteio” era quando o recurso do Estado chegasse do Tribunal de Justiça. Se o “sistema” sorteasse para a 3ª Câmara ele teria então, 19,9% de reajuste e um razoável valor de atrasados para receber do Estado. Mas se fosse sorteado para a 4ª Câmara presidida pelo Des. Araken de Assis, certamente a pretensão de nosso cliente seria fulminada.
E o pior de tudo, para não dizer quase uma loucura é que ambas as decisões são legais. Ou depende de como a vemos. Vamos explicar. O leitor deve estar fazendo um raciocínio muito simples, ora, se a situação de João é igual a de Paulo e o juiz que julga que o processo de João diz que é legal aquilo que ele busca, mas o juiz que julga que o processo de Paulo diz que o que ele busca é ilegal. Logo, uma delas não deve estar de acordo com o direito. Se não está de acordo com o direito seria “ilegal”. Pode ser.
Em tese, quaisquer dessas decisões são legais porque se foram proferidas por magistrado competente (juridicamente) e devidamente fundamentado, se seguiu os ritos processuais, não é ilegal. Aos menos formalmente. Vocês viram o poder do magistrado.
Mas por outro lado, se a lei é a mesma, se a chamada situação fático-jurídica é mesma, mas as decisões materialmente produzem efeitos opostos, logo uma dela é ilegal. Também acreditamos que sim.
Logo, depende do plano que analisarmos o assunto. Esta pequena introdução nos leva a uma gama muito grande de situações que muitas vezes a sociedade não imagina. O cidadão pensa que a “lei” é a “lei” para o João e para o Paulo (exemplo acima). Mas não sabe ele que o magistrado tem a liberdade de interpretar a lei. E um pode interpretar diferente do outro. E se o vencido numa etapa não concordar “pode” ou “podia” interpor recurso almejando uma decisão que uma instância superior que seja conforme a sua pretensão.
Mas porque “podia” interpor recurso? Ocorre que os “legisladores” encontraram os culpados pela demora no julgamento dos processos. No Estado, por exemplo, não é “governo” que aprovou a Lei Brito e depois não pagou. Não é esse mesmo Estado que descontava o IPE previdência (5,4%) do Servidor Inativo, não é esse mesmo Estado que aprovou a Lei para a correção do Vale-refeição e não corrigiu. Não é o IPERGS que não pagava a pensão integral durante praticamente 20 anos só se conseguia na “justiça”. O IPERGS e os 19% para as pensionistas, etc.
Então, onde estão os culpados? Quem são eles? Na semana passada soubemos que encontraram os culpados. Está em todos os sites jurídicos do País. Foram publicados a pedidos nos jornais. São os advogados que como eu estou no escritório, numa sexta-feira, 22 horas, escrevendo neste blog, estudando os processos dos meus clientes. São os advogados que criam, ou melhor, traduzem o direito, que criam alguma “tese” em favor dos seus clientes, que acreditam no direito como um instrumento de transformação social. Que ajuízam uma, duas, uma dezena, uma centena de ações. Que viajam e se reúnem com os clientes. Que fazem reuniões nas associações de classe instigando para que busquem seus direitos. Que no dia-a-dia se deparam com todas essas incoerências ou injustiças praticadas pela “justiça”. Mas uma injustiça “legal”. Mas se é injustiça pode ser legal, pode, já vimos isso antes. A lei permite isso. Que ainda têm uma longa recaída e continuam apaixonados pelo direito. Afinal se não acreditarmos vamos viver uma crise, não uma crise no direito porque o direito está há muito tempo em crise. Vamos viver uma crise existencial. O que seria muito pior.
Afinal, o culpado não é o Poder Judiciário, leias-se Estado que não teve uma estrutura que acompanhasse as necessidades da sociedade. Nada disso, os culpados são os advogados e o diagnóstico está feito. O remédio, suprimir recursos, desestimular o ajuizamento de ações, indeferir a gratuidade judiciária para os menos pobres que daí eles não terão acesso a “justiça”. Punir o advogado que recorrer se a tese dele não for a majoritária. Ou seja, ele não pode inovar o direito. É proibido criar.
Pior de tudo, soube ontem que o Estado “latu sensu” gasta R$ 5.500,00 mensais com um preso e R$ 250,00 com um aluno.
Mais uma pequena notícia, curta e triste. Soube ontem à noite que a lei da ficha limpa também é ilegal. É verdade. O que não significa que a Ficha Suja é legal. Pode? Parece que pode.
Depois de tudo isto temos que torcer para que os processos dos nossos clientes sejam “sorteados” para quem julgar em nosso favor.
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